Aquarela
AQUARELA
Letra de Vinícius de Moraes
Música de Antônio Carlos Pecci (Toquinho)
Acho que se as letras do livro de poesia do Vinicius, Arca de Noé, não tivessem sido musicadas por Toquinho, elas fariam parte de apenas mais um bom livro voltado para as crianças.
Estimulado pelo parceiro poeta, Toquinho criou verdadeiras pérolas musicais que há muitos anos vêm embalando gerações.
Uma das que mais me impressiona é esta. A letra é impecável e a música perfeita. É uma obra-prima, saída da genialidade desse músico incrível.
Com a péssima qualidade de muitas músicas do cenário musical brasileiro, o acervo de Arca de Noé e Arca de Noé II é um verdadeiro presente para os educadores, que realizam com este material trabalhos psicopedagógicos maravilhosos com o público infantil.
Com tantas crianças vivendo em cenários cruéis e de muita miséria, a linda letra e bela música fazem com que elas possam sonhar, imaginar e esquecer um pouco dos seus ais.
Até hoje, Aquarela resgata em muitos adultos a criança que está em cada um de nós.
Aquarela foi gravada em Italiano e em Espanhol, fazendo também muito sucesso nos dois países e em tantos outros países que falam esses idiomas.
Aos 23 anos, Toquinho já acompanhava Chico Buarque nos seus shows pela Itália. Em 1970, compôs com Jorge Benjor o sucesso “Que Maravilha” e, no mesmo ano, segue com Vinícius para Buenos Aires, começando uma parceria que durou muitos anos, resultando daí 120 canções, 25 discos e mais de mil espetáculos. Aquarela é um grande destaque desta famosa dupla.
Análise da Letra da Música
Numa folha qualquer
Eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo…
Não precisa ser uma folha especial, papel de seda ou algo do tipo. Pode ser papel de pão, num papelão ou mesmo no piso do chão. Qualquer lugar é perfeito para se desenhar. Já no primeiro verso, o poeta não dita normas, mas dá liberdade de expressão às crianças.
Quem nunca desenhou um sol amarelo, motivado pela letra desta música ou que não tenha feito um castelo com alguns pares de retas. É mais fácil que construir as fortalezas medievais com a areia da praia.
A letra e a melodia de Aquarela nos fazem viajar para dias ensolarados e bonitos, como daqueles vistos nas belas histórias infantis de Charles Dickens, Irmãos Grimm, Andersen, Charles Perrault, Carroll, entre outros.
Corro o lápis em torno
Da mão e me dou uma luva
E se faço chover
Com dois riscos
Tenho um guarda-chuva…
Como num passe de mágica, contornando os dedos da mão com o lápis, surge fácil uma perfeita luva. E o poeta vai brincando e fazendo imaginar quão gostoso é se perder nesse universo infantil, no mundo de faz de conta.
Muitas atividades escolares são realizadas a partir desta letra e música. Usando lápis, giz colorido ou tintas, as crianças se divertem e dão asas para a criatividade.
Se um pinguinho de tinta
Cai num pedacinho
Azul do papel
Num instante imagino
Uma linda gaivota
A voar no céu…
E, se de repente, algo de errado possa acontecer, não tem problema, transforma-se o pequeno descuido num lindo pássaro a voar no céu. Como um artista, dando formas inesperadas na sua tela. Talvez seja o poeta a instigar nas crianças o surgimento de novos Monet, Renoir, Picasso ou um Di Cavalcanti.
Vai voando
Contornando a imensa
Curva Norte e Sul
Vou com ela
Viajando Havaí
Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela
Branco navegando
É tanto céu e mar
Num beijo azul…
Neste mundo de ficção não há limite de tempo ou de espaço. A grande linha do Equador é como um tobogã gigante a nos levar de um lado a outro do globo em fração de segundo. Escorregando ou navegando num barco branco entre o céu e o mar, tudo é mágico, como um beijo azul – o tocar das duas lindas superfícies imensas, a celestial e a marítima.
Entre as nuvens
Vem surgindo um lindo
Avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo
Com suas luzes a piscar…
O sonho de voar está em toda criança. Quem ainda não sonhou estar voando, sendo pássaro ou mesmo como passageiro de um avião a cortar as nuvens, que nos parecem flocos de algodão, com todas suas luzes a piscar. Lá de cima, tudo se faz mais lindo, como o primeiro astronauta a contemplar a terra, aquela imensa bola azul.
Basta imaginar e ele está
Partindo, sereno e lindo
Se a gente quiser
Ele vai pousar…
Fingindo ser o piloto da aeronave, você vai para onde quiser e pousa quando achar que é hora. Principalmente quando o céu é de brigadeiro, “sereno e lindo”, fica mais perfeito ainda.
Numa folha qualquer
Eu desenho um navio
De partida
Com alguns bons amigos
Bebendo de bem com a vida…
A vida é feita de partidas e chegadas, por isso, devemos aproveitar ao máximo viver de bem com todos, estar bem coladinho aos amigos, comemorando sempre.
De uma América a outra
Eu consigo passar num segundo
Giro um simples compasso
E num círculo eu faço o mundo…
Como Alice, entrando na toca do coelho, um espécie de mecanismo de fuga da realidade, descobrindo outro mundo: O País das Maravilhas. Num piscar de olhos, tudo em volta, você pode transformar, com um simples giro de compasso.
Um menino caminha
E caminhando chega no muro
E ali logo em frente
A esperar pela gente
O futuro está…
O poeta quer levar, na figura do menino, as crianças ao futuro, carregadas pela imaginação. Não presa a regras ou metodologias cansativas, de forma colorida e engraçada, cheia de alegria. Também nos mostra que na vida há obstáculos, os “muros”, mas que, com criatividade, podemos ultrapassá-los.
E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo, nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença
Muda a nossa vida
E depois convida
A rir ou chorar…
Às vezes queremos determinar o futuro de nossos filhos, como eles devem ser e aquilo que devem fazer. Planejamos tudo, e o que acontece é que pouco sai como a gente quer. A frustração (o descolorirá) é grande, levando muitos pais a chorar ou, quando algo dá certo, é motivo de riso. Esquecemos que cada uma é uma individualidade, com personalidade própria, tendo um novo a ser trilhado, sem interferências.
Esse futuro é como uma “linda passarela” que vai se abrindo, conduzindo-nos pela mão, bastando ter sensibilidade para dar cada passo no rumo certo.
Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar
Vamos todos
Numa linda passarela
De uma aquarela
Que um dia enfim
Descolorirá…
Autor José Maria Cavalcanti
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Por muitos anos, Toquinho foi o melhor violonista do Brasil e ainda hoje é um dos melhores. Viveu intensamente um romance vigiado com a atriz Leila Diniz e é cantor, compositor e músico reconhecido mundialmente. Aquarela é uma de suas preciosidades que por muitos anos foi trilha sonora de vários programas infantis. Toda vez que escuto essa bela melodia lembro do livro de Antoine de Saint Exupery, O pequeno Príncipe, e de uma passagem em que ele declara: “somos responsáveis pelo que cativamos”.
Sempre vivi cercada de crianças, principalmente de meus sobrinhos, por isso, tive que acompanhar Show da Xuxa, Balão Mágico, Castelo Ra-tim-bum, Vila Sésamo e o Sítio do Pica-pau Amarelo, pois tudo vira coletivo numa casa de uma só TV. Fofão, Bozo, Sérgio Malandro, Mara Maravilha, Eliana e Angélica eram o centro das atenções da garotada e presenças obrigatórias na decoração das festas infantis. Ouvindo essa música, lembro que muitas vezes tive que copiá-la, pelo rádio, para decorá-la e cantar para as “minhas crianças”. Época de minha vida que me traz alegres recordações.
Aproveito a oportunidade de homenagear o programa dos Trapalhões com os inesquecíveis Dedé, Didi, Mussum e Zacarias.
O magnífico poder da mente, do viajar da memória , faz nos sentir em total liberdade dos sonhos como a música mesmo trabalha didaticamente impecável.
E interpretação sábia como sempre do meu amigo Cavalcanti.
Recordo desta música, as imagens sendo brotadas do papel. A famosa mãozinha desenhada no papel se perpetua pelas escolas.
Foi muito feliz na escolha da música Cavalcanti. Obrigada por nos permitir relembrar e agregar conhecimentos que às vezes nos passam despercebidos. Sempre existe algo a assimilar por sentimentos diferentes.
Beijos
Li
Lupicínio Rodrigues compôs a música “felicidade” e retrata o mundo do imaginário e de como tudo se resolve em um passo de mágica. Vinícius de Moraes vai mais além conclamando em “aquarela” que devemos continuar vivendo com a pureza e o modo simples de resolver as coisas das crianças, abertos a novas descobertas, dando um sempre um passo a mais, além de nosso muro de proteção, pois não podemos prever o futuro, que é sempre incerto, e só termina com a morte, o descolorirá.
Agda
Amo esta música, maravilha, show de animação, parabéns pelos textos.
O material é excelente para trabalhar em sala de aula.
Estava procurando algo especial para um projeto que desenvolvo junto com algumas amigas do Curso de Pedagogia, quando me deparei com este rico conteúdo, fiquei maravilhada, vai ser muito útil pra nós.
Um material incrível para trabalhar com meus pimpolhos em sala de aula.
A música é apaixonante. Eu já havia escutado, mas só agora mergulhei de cabeça com sua análise.
Muito grata.