Pedido de Perdão
A ESTRANHA SÚPLICA
O pequeno Antônio foi pegar o vestido de noiva na casa da costureira, conhecida como Dona Naná, a pedido de sua irmã Odete. Ela estava toda eufórica para ver seu belo traje branco, depois da prova final da fina roupa. O motivo daquela alegria era que seu casamento estava próximo, iria ocorrer dali a três dias.
Toninho, após apanhar a encomenda especial, saiu pelo caminho com a caixa na mão, passando pelo campinho de futebol, que ficava na várzea do Inharé. Os amigos, logo que o viram, gritaram para que ele completasse o time em desvantagem numérica. O menino, numa alegria indizível, perdeu o controle, de tão emocionado que ficou pra jogar. Naquele instante, nem se lembrou da importância de não parar pelo caminho. Aquela havia sido a recomendação de sua mãe, que também estava ansiosa com os preparativos daquele casamento que estava roubando suas horas de sono.
Depois de depositar a caixa enorme no canto da trave, pertinho do umbuzeiro, Toninho disparou para se encaixar entre os zagueiros adversários, pois ali era seu campo de atuação: a área do gol. Ele nem percebeu quando o vento ficou mais forte, arrastando tudo que estava desprendido. Ninguém nem percebeu a caixa sendo levantada pelos ares, fazendo voar a tampa e o vestido branco. A peça foi se arrastando pelo chão sujo e cheio de carrapicho, até que foi arremessada contra uma cerca feita com arame farpado.
Logo a força do vento chamou a atenção dos meninos que jogavam, e Toninho percebeu que a caixa já não estava no local que havia deixado. Correu desesperado para procurá-la, mas foi em vão. Catou apenas o que foi possível para mostrar em casa.
Chegou chorando, como se aquilo fosse aliviar sua situação, pois sabia da importância daquele vestido para sua irmã. Logo perceberam pelos trapos que carregava que algo de ruim havia se passado, e nem perguntaram se ele havia se machucado ou se estaria passando mal, concluíram de imediato que ele aprontara alguma com o vestido.
– Toninho, para de chorar e diz logo o aconteceu, moleque! Gritou sua irmã, embravecida.
Com dificuldade e gaguejando, Toninho finalmente conseguiu explicar o acontecido, fazendo o mundo cair em sua casa. Sua irmã entrou logo em desespero, vendo seu sonho desabar e temendo não se consumar o seu esperado casamento.
Embora sua irmã e sua mãe ainda não tivessem tocado nele, o que era quase certo, seu pai com certeza o pegaria, isto ele não tinha dúvidas. Somente aquele “Já pro quarto!” de sua mãe não iria aliviar aquela tragédia, já nas vésperas do casamento.
Ficou trancado durante horas, na expectativa da chegada paterna. Mas era aquele clima que se armou em sua casa que mais o deixava em pânico. Teria que se controlar no castigo do quarto, até o cair da noite.
Aquele tempo de espera era terrível. Ninguém mais falou com ele, escutando somente o inconsolável choro de sua irmã pela casa.
Enquanto isso, Toninho se lembrava que já havia aprontado todas, mas reconhecia que aquela fora a pior que ele havia passado. Seu pai já não puxava mais as orelhas, agora dispunha de uma varinha de marmelo que ficava atrás da porta, pronta pra reprimenda seguinte.
Alheio a tudo que se passava na sala e depois de escutar a chegada do pai, Toninho só esperava o momento de ser açoitado. Sabia que tudo seria somente uma questão de tempo.
Mais duas horas se passaram, e nada acontecia. O silêncio era uma verdadeira tortura. A barriga já dava sinais constantes de fome, fazendo seu corpo se contorcer muito mais pelo nervosismo.
Forçado pela grande ansiedade, Toninho se impacientou e resolveu sair voluntariamente do castigo. Passou no quarto maior, pegou o cinturão e o dobrou, sem se importar com a fivela. Caminhou lentamente até a sala, apresentando-se cabisbaixo diante do seu pai.
Estendeu o cinto em sua mão para ele, rogando que ele aplicasse a merecida punição:
– Pai, tá doendo muito em mim. Pode me bater logo! Disse o menino.
O pai, ao ouvir aquela inusitada súplica, ficou comovido e entristecido, não encontrando forças para aplicar aquele castigo. Ainda assim, olhou para o filho que insistia com os braços levantados para ele. Era muito estranho ver seu filho pedir para ser surrado.
– Filho, acho que você já foi punido e com certeza aprendeu a lição para ser mais responsável daqui por diante.
E o pai seguiu falando:
– Sua sorte é que Dona Naná achou tão lindo o modelo do vestido da revista que não resistiu e fez outro, do mesmo tamanho, para deixar pra aluguel. E assim que ela soube do ocorrido, ela logo emprestou o dela pra sua irmã, sem ter de pagar nada.
Vendo a expressão de alívio na carinha do filho, o pai o abraçou carinhosamente, sabendo que não era hora para correções violentas.
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Acho que qualquer pai, por mais rigoroso que seja, não deixaria de perdoar o filho depois de uma súplica tão comovente, mesmo sabendo ser ele merecedor de uma boa correção.
Valeu, Vila.
Grande abraço!
Muita sorte teve esse toninho, pois antigamente surra prometida era surra dada. A gente podia falar o que fosse, prometer que não iria acontecer mais, porém de nada adiantava. Naquela época a surra servia como educação na prática, coisa errada era corrigida com punição. O texto ressalta a importância do futebol na vida dos meninos e meu irmão José fazia muito isso, minha mãe pedia para ele comprar o pão e ele saía antes das quinze horas e só retornava com a encomenda lá pelas dezoito horas, com a roupa toda suja de terra e um pacote de pão enrolado em tiras de papel de embrulho. Ele só não apanhava, pois chegava antes da hora de servir a sopa do jantar. Só de imaginar o desespero de Odete em ver tudo indo de água abaixo, em um dos momentos mais importante de sua vida, vejo que o moleque teve realmente muita sorte.
Acho que o castigo psicológico pode ser bem pior que o físico… A dor física desaparece, a dor psicológica pode ficar pra vida inteira.
A educação, às vezes, parece como uma boa partida de xadrez: a ameaça constante e nunca realizada, faz com que o jogador examine todas as suas fraquezas, até quando descobre aonde o perigo possa ser mais real; um educando, nestas condições, faz um exame de consciência e, ao final, sai do castigo (bem mais) amadurecido.
Parabéns pelo conto e obrigado por continuar este belo trabalho.
Um abraço e vamos, enfim, marcar aquele jantar aqui em casa.
Quem na infância não passou por um sufoco como esse.
Sempre fui contra o castigo físico, fui criada pelos meus tios e nunca apanhei, ficar de castigo, deixar de fazer o que gostava era a maneira que eles encontraram de me ensinar a refletir nos meus atos e não cometer o mesmo erro novamente.
Lembro que eu gostava de ir ao cinema assistir aos filmes do Mazzaropi e um dia me arrumei toda e fui pedir dinheiro ao meu tio para ir ao cinema ver “Um caipira em Bariloche”, qual foi a minha surpresa: – Hoje você não vai, pois está de castigo, fiquei super triste, afinal aquele era um filme que queria ver muito.
A educação é uma tarefa muito difícil para os pais, principalmente nos dias de hoje, as coisas mudaram muito e às vezes acho que algumas medidas mais antigas eram melhores.
No lindo conto, o pequeno Antônio, enquanto aguardava a surra, pôde refletir e sentir a grande tristeza que causou a sua irmã, a “estranha súplica” demostrou todo o seu arrependimento.
Alguns pais ficam em dúvida sobre qual caminho tomar na hora de coibir as ações impensadas dos filhos.
Força ou jeito. Há os que defendem o uso da agressao física, e aqueles que dizem que o castigo psicológico é mais efetivo.
O certo é que todos agem de bom coração, no intuito de tornar os filhos em pessoas melhores, embora que muitas vezes não sejam compreendidos.
O texto aborda valores e responsabilidades, acho que deram uma tarefa grande demais para um menino e cobraram um preço alto pelo seu pouco julgamento de senso de valor. O convite inusitado para compor um time de futebol é com certeza algo bem atrativo para uma criança e o pacote podia esperar. Como uma criança poderia quantificar o valor de um casamento e o quanto aquela roupa era especial. Para ele, na sua inocência, nada era tão importante do que o convite para compor um time de futebol. Acho que foi uma lição para toda a família e que, fazendo uma análise da situação, Toninho só agiu como criança.
Eu entendo o desespero da irmã do Toninho porque algo parecido comigo na hora “H” do meu casamento. A costureira, por incrível que pareça, quase comprometeu a data mais importante da minha vida.
Na dia da última prova, ela ficou de soltar um pouco o vestido, visto que minha barriga estava aumentando cada vez mais, afinal eu já estava no quinto mês de gravidez.
Quando fui sair do carro, não consegui, o vestido simplesmente estourou comigo.
O Toninho, assim como dona Augusta, deram seus vacilos, que são até perdoáveis para uma pessoa de pouca vivência, como o garoto, não como a profissional que me garantiu que o vestido não iria ser problema.
Na hora de entrar no vestido, vi de cara que algo não estava bem, mas não havia tempo para mais nada a não ser tentar encolher a barriga. Dentro do carro, tudo mudou. Senti o romper da costura e, quando tentei sair do veículo, perdi no impulso inicial alguns botões.
Voltei pra dentro do veículo e fui direto na casa de dona Augusta para ela dar um jeito.
E a tradicional espera de meia hora chegou ao cúmulo de uma hora de atraso, mas a costureira conseguiu contornar a situação e eu finalmente pude casar.
Hoje o assunto é motivo de boas risadas, mas me deu muita dor de cabeça e muito o que falar.
Recordei dos meus tempos de peladas lá na Vila Ester, periferia do meu recantinho mineiro. Assim como os outros amigos, todos eram de origem simples, mas Manu vivia em situação mais difícil e necessita vender balas para arranjar alguma grana pra ajudar sua família.
Era comum vê-lo pelas ruas e na escola carregando aquele tabuleiro com os compartimentos cheios de pirulitos, cichetes, jujubas e um mundão balas.
Quando era hora de jogar, Manu nem queria saber, largava o tabuleiro num canto e corria pra fazer aquilo que ele mais gostava.
Um dia após o futebol, avançamos e metemos a mão nas guloseimas, não deixando uma sequer pra contar a história.
Manu chorou desesperado por saber que ninguém tinha grana pra pagar e uma surra levaria na certa.
Até hoje não sei o que realmente aconteceu, o certo é que nunca mais Manu apareceu pra jogar com a gente.
Esta história, que teve um menino como protagonista, poderia ter sido vivida por uma menina. Afinal de contas, o futebol hoje é praticado por homens e mulheres.
Veja o vídeo de meninas jogando bola nas areias de uma praia de Santos/SP.
Casamento e futebol, mania de brasileiros, sonhos de meninas e meninos, mundos de encanto. É de se supor que toda menina queira casar, assim como todo menino quer ser um astro do futebol. Lembro dos meus irmãos que sumiam atrás de uma bola e só se lembravam que deviam voltar para casa quando não existia mais possibilidades de formar outras equipes para mais uma rodada de futebol. Eram “tarados” pela bola e qualquer tempo, sol ou chuva, era bom para uma boa pelada. Eles eram bons de bola e o mais velho chegou até a fazer parte de uma equipe profissional. Lembrei também de minha irmã que mantinha um namoro firme e que tinha o sonho de se casar quando terminasse os estudos. O tempo é sabedor dos destinos e ele se encarregou de colocar ponto final naqueles sonhos. Estudo e trabalho prevaleceram e meus irmãos seguiram destinos com os pés no chão e minha irmã desprendeu dos sonhos infantis. Belo texto, pois ele nos remete a uma época de “bola de meia, bola de gude”.
Passei por situações iguais a de toninho, mas acreditem eu já tinha 7 anos de idade e trabalhava fora, mas não me contendo um dia saí da escola e de lá direto para o meu trabalho, quando passei por um lugar que chamava Riquinho, pois o prefeito da época tinha sobrenome de Rico, Joaquim Rico, que construira um local onde as crianças carentes podiam brincar, ir na piscina, parquinho, enfim muitas diversões, e como estava calor eu passava por perto para ir trabalhar e quando vi a piscina cheia e a bola flutuando, onde o munitor jogava vôlei com as crianças na água, não me exitei e de shorts e camiseta da escola me joguei na água também, e ali me esqueci das horas, quando me dei conta já se passara 2 hs da hora de chegada ao meu trabalho, peguei minhas coisas e saí rapidinho para o trabalho, ao contrário de toninho ao chegar em casa minha patroa já havia contado a minha mãe e além das palmadas o castigo veio junto, não me livrei deles, mas hoje me lembro com alegrias pois mesmo tendo que ter responsabilidade de adulto sempre dava um jeitinho de brincar. se hoje sou a pessoa que me formei foi graças as palmadas e castigos de minha mãe que me criara sem meu pai por perto pois ele viajou mais cedo para o céu!
Como sempre Cavalcanti seus contos lembram minha infância!
Grande abraço e Parabéns por seu sucesso!
Matéria…..interessante
Meu Caminho
No passado
Quase no início do meu aprendizado
Uma frase esquecida
Uma agressão recebida
Tanta tristeza
Neste momento a certeza
De que teria que lutar muito
Para conseguir algo
Aqui agora
Você me atrapalhando
Quando isso estou escrevendo
E você não entende
Mas tudo isso foi uma lição
Que me deu forças e mostrou o caminho
Para percorrer e sair da escuridão
Deixar o ninho e voar
Sair sozinho
Aprender com a vida
Buscar meu caminho
Em coisas muitas vezes escondidas
Escondidas onde só eu posso ver
Estão nas entrelinhas das poesias
Alimenta o meu viver
Muito mais do que poderia imaginar
Feliz quem consegue ver assim
Tudo é belo
São flores para mim
Deixa meu caminho mais claro
E livre da escuridão
Consigo ver amor em tudo
Até mesmo nesta paixão
Que hoje me abre o futuro
Futuro que começou lá no passado
Hoje são saudades que sonho acordado
Pois sei o que é o amor
E até mesmo onde encontrar
Sei que está aqui
Segue a meu lado
Sabe tudo que vivi
E como sou apaixonado
Valeu tudo isso
Me deu forças para seguir
Hoje sei que até o futuro
Amanhã vou conseguir.
Autor Roberto Hentz
Seguir o nosso caminho, com fé e esperança. O futuro será melhor … sempre melhor.
O gesto do menino e a foto do conto são de uma ternura incríveis. Tenho verdadeira atração pela fotografia em preto e branco, ademais quando se consegue captar um momento raro como esse.
Felipe
Bela história que todos nós vivemos uma vez, e muito bonita poesia postada pelo meu primo Mario Carlos. Parabéns, e um grande abraço
Meu sogro conta que, certa vez, mandado pelo pai, fora buscar o burro pra ser carregado de balaios de hortaliças para serem vendidas no mercado ali da vila, e lá foi ele. No meio do caminho, encontrou o Alfredinho, seu amigo, que o convidou para invadir a roça do Seu Naná, com o intuito de roubar melancia. Proposta aceita na hora pelo Zezinho. Ficaram horas degustando os frutos, e o Zezinho, depois da aventura, esqueceu de pegar o burro, chegando em casa sem o animal. Adivinhe o que acontece naquele dia e o que sente até hoje quando ouve falar em melancia… Seu lombo ainda dói muito!