Parceria Iluminada – João Bosco e Aldir Blanc – Elis Regina
CORSÁRIO
João Bosco e Aldir Blanc
Meu coração tropical
Está coberto de neve, mas
Ferve em seu cofre gelado
E a voz vibra e a mão escreve: mar
Bendita a lâmina grave
Que fere a parede e traz
As febres loucas e breves
Que mancham o silêncio e o cais
Roseirais! Nova Granada de Espanha!
Por você, eu, teu corsário preso,
Vou partir a geleira azul da solidão
E buscar a mão do mar,
Me arrastar até o mar,
Procurar o mar
Mesmo que eu mande em garrafas
Mensagens por todo o mar
Meu coração tropical
Partirá esse gelo e irá
Como as garrafas de náufragos e as rosas
Partindo o ar
Nova Granada de Espanha
E as rosas partindo o ar!
Assim como aconteceu com a música Corsário, João Bosco conta que, sempre que entregava uma composição para Elis Regina, dali se abria uma janela de tempo até que ela apresentava ao mundo sua versão final do trabalho. Sua voz emblemática marcava de tal maneira a composição que era difícil para o autor cantá-la com diferente roupagem.
Todos os autores sabiam que Elis imprimia uma marca a tudo que fazia, como se fosse a vida e alma dela sendo sopradas na melodia e letra. O resultado fabuloso desse ansioso tempo aguardado era sempre um produto final cheio de magia e genialidade.
Quando ela ia ao palco defender cada música, entregava-se totalmente, colocando muita emoção e calor humano em cada apresentação, algo trazido de suas vivências, além dos sentimentos doces, e por vezes amargos, de seus intensos e conturbados envolvimentos amorosos.
Já o próprio autor, João Bosco, ao levar o mesmo tema – CORSÁRIO – a público, faz sempre uma introdução musical, com sua levada e voz autênticas. Ele faz isto com estilo todo próprio, com peripécias harmônicas produzidas no seu inseparável violão. Estes versos são como um pano de fundo para iniciar seu canto:
“Fiz ranger as folhas de jornal, abrindo-lhe as pálpebras piscantes, e logo de cada fronteira distante subiu um cheiro de pólvora, perseguindo-me até em casa. Nestes últimos vinte anos, nada de novo há no rugir das tempestades. Não estamos alegres, é claro, mas por que razão haveríamos de ficar tristes com o mar da história, que é agitado. As ameaças e as guerras, havemos de atravessá-las, rompê-las ao meio, cortando-as como uma quilha corta as ondas.”
Não só a Elis e o João Bosco interpretaram Corsário. Este tema musical já foi cantado por Ney Matogrosso, Djavan, Zizi Possi e até por Daniela Mercury.
Tais artistas também imprimiram suas marcas nesta obra-prima de João Bosco e Aldir Blanc.
CORSÁRIO
Meu coração tropical está coberto de neve, mas ferve em seu cofre gelado…
Corsário – todos sabem que os corsários eram piratas, exímios na arte de navegar, que saqueavam navios antes que eles chegassem a seus destinos finais, no intuito de roubar suas mercadorias ou outros objetos de valor: ouro e prata.
O poeta se utiliza de muitas figuras, nos versos poéticos, para viver o drama provocado pelo afastamento que se dá entre ele e sua mulher amada. Estando distante, seu coração tropical, quente, é açoitado por ventos gelados em seu cárcere (prisão), que tentam em vão apagar a chama que arde em seu peito, o qual é comparado a um “cofre gelado”.
E a voz vibra e a mão escreve: Mar
Mesmo sofrendo e passando aperto, ele ainda encontra forças para falar e escrever a palavra mais significativa: MAR – sua vida, que representa sua carência e a imensidão física que o separa do seu amor.
Bendita a lâmina grave Que fere a parede e traz As febres loucas e breves Que mancham o silêncio e o cais
Este vento ruidoso e cortante é como lâmina que fere, provocando sangramento que mancha seu lugar seguro: o cais, onde ele está atado. O corpo, tal qual paredes que envolvem o cofre, tem fragilidades e adoece com febres loucas.
Roseirais! Nova Granada de Espanha! Por você, eu, teu corsário preso
Na América do Sul, a Espanha fincou bandeira e fundou Nova Granada, que tem “Rosales” (roseirais) como um de seus rincões. O local hoje é Bogotá – capital da Colômbia.
No local, havia uma antiga prisão da coroa Espanhola, que servia para desterrar e aprisionar perseguidos políticos, mantendo-os longe da Europa.
Assim como Portugal, a Espanha também usava extrair muitas riquezas de suas colônias, assim como aconteceu com o Brasil e outros tantos países, enquanto durou este julgo colonial.
O corsário era um sinônimo de liberdade. O poeta diz que, pela amada, ele é “um corsário preso”, isto é, por ela, ele abriu mão do mar: local do seu viver livre.
Vou partir a geleira azul da solidão E buscar a mão do mar, Me arrastar até o mar, Procurar o mar
A solidão é qual um geleira gigantesca e indestrutível a isolar as pessoas que se amam.
Como um navio quebra gelo rompe as grossas camadas geladas que impedem a aproximação, ele quer “procurar o mar”, “se arrastar até o mar” e “buscar a mão do mar”. Dessa forma, ele estará de novo em contato com seu querido ambiente náutico, único meio de atingir o objetivo de se juntar novamente a seu amor.
Mesmo que eu mande em garrafas Mensagens por todo o mar
São famosas as garrafas lançadas ao mar, quase todas têm o intuito de levar mensagens de amor ou de socorro aos lugares distantes.
Partirá esse gelo e irá Como as garrafas de náufragos e as rosas Partindo o ar
Somente a via marítima possibilitará o “partir o gelo” (solidão) e, como as garrafas de náufragos (correio eletrônico ou outras mídias sociais) no seu flutuar sobre as ondas, ele buscará na imensidão das águas o caminho de volta que o levará a sua rosa, a qual exala fragrância no ar. Estes aromáticos ventos também são a força motriz que move as velas da embarcação (as asas da imaginação).
Nova Granada de Espanha E as rosas partindo o ar!
O cheiro das rosas de Nova Granada é como uma inspiração para fazer o corsário navegar uma vez mais.
Belíssima e intelectual interpretação da canção interpretada por Elis Regina, de autoria de João Bosco e Aldir Blanc. Parceria iluminada e profundamente artística, como todas as canções que cantava a Elis, românticas e cheias de conteúdo poético.
Esta análise do José Maria Cavalcanti enalteceu também o blog – STAR ELIS.
Achei linda demais a Elis Regina nessa foto de bruços sobre esse balcão da avenida Atlântida em Copacabana, lá pelos anos sessenta ou setenta, em branco e preto (Elis e esse Rio antigo, onde ela era parte do paisagem Carioca).
Boa seleção de fotografia histórica da cantora mais popular do Brasil. Se puder mande-me mais. Em realidade te devo uma visita no teu Blog, esta semana estou nele.
Recado para o Mario (Marujo): ontem jantamos todos juntos em casa com a Marta e sua “turma”, passamos um momento inesquecível, onde você sempre estava presente. Anelamos que pronto você possa nos visitar pra estar todos juntos como estivemos na Ilha Bela.
Boa semana e um abraço nosso.
Pedrinho.
Esta música Corsário fala de uma espécie de pirata que navegava com sua embarcação armada de propriedade privada, que podia perseguir ou apresar navios de comércio de outros países. Antes do desenvolvimento dos navios de guerra, muitas nações recorriam a esse tipo de navios para auxiliá-las em casos de necessidade. Empregados pela primeira vez no séc. XV, os navios recebiam carta de corso e tanto eles como suas tripulações eram conhecidos como corsários. Tinham autorização para atacar, roubar ou afundar os navios mercantes dos países; inimigos.
Mario Carlos Fernandez.
Para minha analise sobre interpretação se “corsário” coloquei a música no fundo para poder comentar:
Conto que gosto de Elis Regina desde muito cedo, e não sei por que pós morte dela o irmão lançou a música em CD, comprei, pois meu interesse maior era em outras músicas… Mas ao ouvir “Corsário” parei, voltei , volitei várias vezes novamente e comigo mesmo me perguntei como essa mulher não deixou isso ser gravado, o que ela quer passar a seus ouvintes o que quer dizer com essa letra?
Fiquei endoidecido, anos a fio ouvindo essa música a partir de ontem ouvindo mais ainda tanto que minha irmã falava você só tem essa música para escutar?
Fiquei na minha cabeça com essa ideia martelando para saber quem cantava essa música e que significa, afinal toda música mexe com a sensibilidade e o estado de espírito do ser humano…
“Ontem quando consegui “FINALMENTE” entender depois de muitos anos o “VERDADEIRO” sentimento” da letra dessa bela música… gravada por raridades……tem que ter uma boa cabeça, bom gosto e excelente repertório para gravar uma letra dessas…..
Vivemos num mundo atual que as pessoas estão disputando à tapa a vaga para virarem cantor (A) a qualquer custo de privilegio e de vida…… mas quem até hoje selecionou essa música, teve coragem de se arriscar de interpretar e cantar ? Simplesmente ninguém!
“ Pois “Corsário” é para quem sabe” verdadeiramente” o que é uma boa música e excelentemente, interpretada e passada ao preto no branco o que cada letra significa.
Deus queira que usufruam disto e passem a escutar melhor o que determinados cantores como “ELIS” passou para nós para toda a eternidade…
Pura emoção!
Gosto muito da música imaginem agora com tamanha interpretação de letra que somente gênios sabem e souberam cantar…
Estou impressionada com a belíssima análise desta música, que possui uma letra tão complexa e difícil de entender.
Até então não tinha prestado atenção em toda a letra, sempre me lembrava somente do refrão.
É muito interessante ler e refletir sobre essa análise, que nos faz dar um valor muito maior a essa bela canção de João Bosco e Aldir Blanc.
Muito gostoso ouvir a belíssima interpretação na voz da inesquecível Elis Regina.
A interpretação do Cavalcanti é impecável tirou todas minhas dúvidas… eu sempre quis saber o que essa letra da musica queria dizer ….fiquei muito contente
Bela análise da música Corsário. Tenho um amigo, cantor da noite, Jan, que quando ele me vê diz logo: corsário. Essa música tem um significado para mim de uma época de acampamento em praias, quando fazíamos luau, junto a fogueiras, tomando batidas de tamarindo e escutando música ao som de violão. Sandro estava cantando, mesmo estando triste, pois sua namorada foi proibida, pelos pais, de nos acompanhar na praia. Ele tocou essa música e disse: é como me sinto. Mesmo perto da lua, do mar, de amigos, da música e do fogo, continuo pirata do amor. A ilha de Corsa, na Espanha, era utilizada pelos piratas como porto seguro, pois não havia autoridades formais.
Parabéns por la excelente descripción de esta bellísima canción.
Quiero que sépas que te admiro profundamente y que me encantó este maravilloso trabajo, dedicado a una cantora tan increíble como “Elis Regina”, que varios de mis primeros discos comprados en São Paulo fueron exclusivamente de ella, ya que me gusta muchísimo oir sus bellas canciones; y tanto sentimiento en sus interpretaciones.
Maria Rita consiguió rescatar toda esa belleza que me transmitía su madre.
Parabéns más una vez y seguiré disfrutando de tus postagems.
Un fuerte abrazo.
Já tinha escutado, mas não visto… belissímo!
O Corsário então está dentro de cada um de nós.
Amamos de longe o ser amado, hoje mais fácil, pois um e-mail resolve o problema de dentro de nossas
naus eletrônicas.
Riquíssima é a letra da música, belíssima e muito competente sua interpretação.
Parabéns Sr. José Maria
Só outro poeta para conseguir adentrar a mente de um compositor e traduzir os seus escritos para nós, simples mortais. A interpretação valoriza ainda mais o trabalho do autor que tanto caprichou nessa bela música de tão bem elaborada letra.
Bem dentro da gente tem um mar… e quando o nosso mar encontra o infinito do mar, real, é tanto a ser dito que a gente emudece. É tudo muito profundo, muito oculto e muito grandioso para ser contido no espaço das palavras.
Eu amo o mar. E como ele, às vezes sinto que muito é o espaço, mas parece ser pequeno quando tudo fica tão, tão agitado, bem lá dentro, nas profundezas. Nas nossas profundezas: minha e do mar…
A música é linda e a interpretação também!
Parabéns!
PERFEITO !!!!
Foi dada a largada para o espetáculo Elis, A musical, que vai contar a vida da saudosa cantora Elis Regina e estreia dia 8 de novembro no Teatro Casa Grande, no Rio de Janeiro. A atriz baiana Laila Garin vai dar vida no palco à cantora. O musical, que promete ser o acontecimento teatral do ano, tem texto de Nelson Motta e Patricia Andrade e direção de Dennis Carvalho. Formada em canto lírico e popular, premiada como atriz nos festivais de cinema de Triunfo e Blumenau por sua participação em dois curtas-metragens, Lara venceu outras 200 candidatas ao papel. “Elis era única, por isso durante as audições optei por não tentar imitá-la, mas interpretar as canções consagradas por ela, do meu jeito, de acordo com a minha história de vida. Agora entro em uma fase diferente. Preciso incorporar o gestual, a maneira de cantar, entrar inteiramente na personagem”, diz a atriz e cantora.
SOBRE O TEMA “PALCOS” – LAILA GARIN (ATRIZ QUE INTERPRETARÁ ELIS REGINA)
Dennis Carvalho, Nelson Motta e Patrícia Andrade faziam parte do júri que selecionou Laila Garin para o papel
Coluna VIP (Correio*)
(telma.alvarenga@redebahia.com.br)
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Laila já começa os ensaios na próxima semana
Ela cantou Como Nossos Pais, Vou Deitar e Rolar, Maria Maria e Fascinação. E encantou a todos os que assistiram às audições para a escolha da atriz que viverá Elis Regina no palco.
Filha de uma baiana com um francês, olhos claros, cabelos ruivos, encaracolados, a baiana Laila Garin, 35 anos, não tem nada a ver, fisicamente, com a cantora gaúcha, que morreu em 1982 e é considerada uma das maiores intérpretes da MPB, de todos os tempos.
Mas foi ela a eleita, por um júri que incluía o diretor do musical, Dennis Carvalho, e Nelson Motta, autor do texto, em parceria com Patrícia Andrade. Na Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia, Laila foi aluna de mestres como Harildo Déda, Hebe Alves, Maria Eugênia Millet…
A atriz, que também estudou canto lírico, atualmente, está em cartaz com o musical Gonzagão — A Lenda, dirigido por João Falcão, no Rio, onde mora desde 2009, depois de seis anos em São Paulo. Ela bateu um papo com a coluna. Confira.
Como foi o teste para viver Elis?
Fui sem pretensão. Não imitei a Elis. Tentei cantar com alma, com essência. Ela era muito visceral.
Você está nervosa diante da responsabilidade de interpretar um mito como Elis?
Dá medo, claro. Mas é uma grande tentação. Ela era maravilhosa. Não pretendo ser como a Elis, isso é impossível. Tem que ver como uma homenagem, uma celebração, uma revisita. Para os mais jovens, uma oportunidade de conhecer um pedaço da história dela que talvez não conheçam.
Como você começou no teatro, em Salvador?
Comecei muito cedo. Com 5 anos de idade fiz uma peça, dirigida por Luiz Marfuz. Foi Ruy Cézar, na (escola) Via Magia, que me fez cantar em cena pela primeira vez e me mostrou o que eu queria fazer pelo resto da vida, a minha grande paixão: cantar atuando e atuar cantando.
Quando começam os ensaios?
Semana que vem. Estou muito feliz e curiosa. Louca para trabalhar com Dennis Carvalho, que conheceu Elis, foi amigo dela, e está sendo muito carinhoso comigo.
O Acervo Elis Regina é um espaço especialmente planejado para reunir documentos e materiais sobre a vida e a obra da artista gaúcha Elis Regina, um ícone da arte de cantar, interpretar e representar a música brasileira. O acervo é formado por material doado por colecionadores, críticos, fãs e público em geral e está aberto a novas doações.
O projeto arquitetônico e museográfico tem espaços para a exibição de audiovisuais, audição de CDs, apresentações musicais e encontros.
Era isso o que estava pensando… “Corsário” de João Bosco.
É lindo!!!
Ótima análise.
Grande interpretação
Simplesmente linda, poética a letra, e a interpretação de Elis, traz vida, forma encantos, sonhos, nostalgia, clamor!!!!
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