Colturi – Coco
DE CARONA COM FANGIO
Com apenas 12 anos, eu não desconfiava que aquele dia iria ficar pra sempre registrado na minha lembrança. Por isso, talvez, venha daí a minha paixão por carros.
Era um fim de tarde do verão de 1944.
Os folhetins de notícias que chegavam à região mais ao sul da Província de Buenos Aires anunciavam tragédias e mortes por quase toda Europa.
Ainda não se sabia quais seriam os rumos que o mundo iria ter após aquele mais terrível conflito bélico mundial.
Enquanto isso, a principal rodovia e demais vias litorâneas seguiam com um fluxo aumentado de veículos, por conta da estação do calor.
As limitações e racionamentos de alguns víveres e combustíveis não diminuíam a euforia dos veranistas, que vinham da capital para desfrutar das praias de Mardel e Miramar, principalmente.
Naquele momento, o governo impunha mais restrições aos usuários de combustíveis. A gasolina azul era para os automóveis e a amarela, mais barata, para os caminhões.
Para que isto fosse cumprido à risca, havia todo um controle pelas estradas principais, com multas rigorosas para quem fosse encontrado burlando a lei.
Naquela última semana de fevereiro, fui com meu cunhado, Eleutério Pedro Fernandez, conhecido como Quico, e minha irmã, Canto, para visitar alguns familiares e amigos que estavam veraneando em Necochea, a uma hora de carro depois de Miramar.
Meu pai, Victorio Colturi, nunca deixava minha irmã sair sozinha. Este cuidado começou aos 18 anos, quando os jovens enamorados se conheceram no atendimento da farmácia de nossa família, localizada em Avellaneda, área metropolitana da capital federal.
Mesmo estando Canto com 23 anos e Quico com 29, era fácil me ver sempre na companhia do romântico casal. Não me chamavam por Carlos, preferiam o apelido de Coco, alcunha que carrego até hoje, dia que completo 82 anos.
Depois de comermos uma “parrilla” de gado Hereford, coisa própria de nossa planície, à tardinha estávamos de volta para Mar del Plata, onde a família Colturi se fixou, a partir de 1889, quando meu avô veio de navio da cidade de Bormio, um lugarzinho frio da Itália, que faz fronteira com a Suíça.
Depois de rodar por quase uma hora, Quico se recordou do posto de controle da “nafta” e, por não querer levar uma multa, desviou o carro por uma estrada vicinal, que seguia até Balcarce.
A estrada secundária não era asfaltada e, vez por outra, era necessário fazer um desvio de algumas pedras ou buracos provocados pelas últimas chuvas.
No meio do caminho, o carro teve um superaquecimento, o que obrigou meu cunhado a parar para não perder o motor. Ele não sabia exatamente o que havia acontecido, mas necessitava de ajuda mecânica.
Depois de uma hora aguardando por algum socorro, passou um caminhão que resolveu parar um pouco mais adiante.
Aquilo deu uma animada, pois nós já estávamos perdendo a paciência, ao vermos que logo seria noite, o que dificultaria em muito aquela situação crítica.
O senhor do caminhão disse que não entendia muito de mecânica, mas que poderia dar uma carona até Balcarce, local onde vivia o melhor socorrista mecânico da região.
Com receio de deixar o carro ali no meio da estrada, a solução se deu com o pronunciamento da minha irmã:
– Deixe que eu vou até Barcarce! Disse com autoridade na voz.
Quico sabia que Canto era muito determinada e já havia pensado em todas as possibilidades. Não seria ele a se opor, além do mais, o caminhoneiro inspirava confiança e respeito, o que era mais importante.
Uma hora depois da partida, ali estava Canto de volta, agora na companhia de Juan Manuel, que veio de imediato para tirar a pane de nosso veículo.
Depois das apresentações, ele foi logo analisar o defeito, verificando, de imediato, que alguma pedra havia rompido a mangueira da água de refrigeração do carro, provocando a elevação da temperatura.
Para fazer a troca, seria necessário rebocar o carro até Balcarce. Lá Juan Manuel tinha muitas peças de reposição, o que representava a melhor maneira de sanar o defeito.
Com todos de acordo, uma corda foi colocada nos chassis dos veículos para fazer o reboque.
Quico teria que ir alinhando o veículo para não sair da estrada, sendo acompanhado por Canto.
Eu preferi ir de carona naquele modelo de carro superdiferente, um modelo com design futurístico.
A viagem foi um tanto lenta, mas chegamos todos bem a Balcarce.
Ali Juan Manuel gastou pouco tempo para substituir a mangueira que se rompeu e tornou a encher o radiador com água, verificando se não havia ficado qualquer vazamento.
Depois das despedidas, regressamos traquilamente de Balcarce para Mar del Plata, sempre driblando os policiais que faziam bloqueios para a verificação da nafta.
O tempo passou e, sete anos depois, estava diante da televisão, quando assistia ao noticiário que anunciava o novo campeão mundial de automobilismo. Seu nome era Juan Manuel Fangio, um argentino nascido em Balcarce – Argentina.
Aquele rosto que eu via ao lado de um Alfa Romeu era o mesmo do mecânico que havia nos socorrido na estrada, sem sombra de dúvida.
Puxa, foi imensa a alegria que senti por aquela grata surpresa!
Agora eu poderia dizer para meus amigos e pra todo mundo que eu já havia estado de carona com o campeão mundial.
Você não pode imaginar quantas vezes contei esta história e me vangloriei dela, principalmente à medida que Fangio ficava a cada ano mais famoso com as muitas vitórias. Ele foi o primeiro piloto a ganhar 5 vezes o título mundial, por quatro escuderias diferentes: Alfa Romeu, Maserati, Ferrari e Mercedes-Benz.
Sua marca só foi superada 46 anos depois pelo alemão Michael Schumacher.
Esta história me foi contada por Victorio Carlos Colturi, que vive em Mar del Plata e hoje completou 82 anos.
Meus parabéns ao aniversariante!
Algumas pessoas invadem nossos corações para sempre.
Este é muito especial, é como um pai para nós, assim com o é verdadeiramente para seus queridos filhos: Carlos e Alejandra.
Não só em Buenos Aires, como também em Mar del Plata, sempre nos recebe com muita doçura, carinho e alegria.
Viajou muito por sua amada terra e outras partes do mundo, sendo um apaixonado pelo Brasil.
É impressionante a memória que ele tem, guarda o nome de todos e todas as datas no seu baú de recordações.
Na festa dos seus 80 anos, ele narrou para mim esta linda página de sua meninice, que aqui, no Blog do Bollog, procuro ser fiel aos acontecimentos.
Tal história ocorreu na época da guerra e diz respeito também aos pais de Marta, que, na época, eram apenas namorados: Eleutério Pedro Fernandez e Maria de Tereza Marta Colturi Fernandez.
Ao nosso querido “Tio Coco”: um feliz e abençoado “cumpleaños”, com muito mais anos de vida.
Um beijo enorme no seu coração de ouro!
Que história linda e emocionante. Pude presenciar o meu tio Coco contando essa história para o Cal com riqueza de detalhes.
Hoje no dia do seu aniversário ele é homenageado com uma das suas tão inúmeras histórias de vida.
Posso imaginar o que ele sentiu ao ver na televisão a figura de Juan Manuel Fangio ao reviver o momento que viveu com ele.
Que lindo será se meu tio tiver a oportunidade de ler esta história e voltar no tempo com suas recordações.
Tive a alegria de comemorar junto com ele o aniversário de 80 anos o que foi muito lindo e emocionante, saímos do Brasil em direção a Buenos Aires e de lá até a cidade de Mar del Plata. Tenho certeza que esse momento marcou muito em sua vida.
Hoje completando 82 anos eu desejo a ele muitas felicidades e muitos anos de vida e que ele possa comemorar em companhia de seus filhos Carlitos e Maria Alejandra, nós desde aqui estaremos unidos a ele no coração.
Feliz cumpleaños tio querido, te quiero mucho.
Obrigada Cal por mais esta linda homenagem ao meu tio que tanto amo.
Hoje liguei para o meu tio para parabeniza-lo pelo seu aniversário e quando contei a ele a surpresa que ele havia ganhado com sua história no blog ele logo me disse: não esqueça que o ocorrido foi em 1944.
Achei muito bacana ver que ele aos 82 anos tem uma memória muito boa, com certeza muito melhor que a minha, kkk.
Ele ficou muito feliz e emocionado com a linda homenagem.
A foto dele que aparece no inicio da história foi tirada no dia em que ele completou 80 anos e foi tirada por mim com muito amor e alegria.
Bela história e lição de vida deste grande homem que sempre teve e tem uma história intensiva de vida.
Grandioso, lutador, muito trabalhador e um homem com uma história de vida com muitos detalhes a serem contados.
Esteve em São Paulo onde eu morava na sua incansável busca pela reconciliação de família, andava dias e dias sozinho nessa grande metrópole como se conhecesse cada pedra dessa enorme selva de asfalto que na época ainda era regada algumas ruas sem calçamento.
Andamos infinitamente de carro em busca de seu objetivo, até que conseguiu e me lembro de estar ao lado dele nesse momento tão importante e de tamanha emoção que foi para ele.
Desejo um feliz aniversário a este tio… um homem muito querido por todos.
Feliz aniversário hoje e sempre
Grande abraço do sobrinho.
Mario Carlos.
Ver e ouvir é normal, mas enxergar e escutar é para poucos, pois necessita de atenção. Feliz de saber que esse relato só poderia ser bem contado por alguém que deu toda atenção ao que lhe foi dito. Em nosso corre corre da vida, muitas vezes não prestamos atenção ao que nos é posto diante de nossos olhos ou no que é nos contado pelos mais velhos. Um belo texto, visto que nos mostra que o senhor Vitório fez parte da história de um campeão e se não fosse dado o interesse por seus relatos esse fato não seria agora de domínio público. Parabéns!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Paixão por carros!
Esta historia tan bien contada y narrada por Jose Maria, la escuche infinidad de veces mas otras tantas historias que Papa siempre rememora y es muy lindo leerla como un buen cuento.
Ya cumplio sus 82 años y sigue recordando sus vivencias con muchisimos detalles, supongo que este acto de volver al pasado a traves de sus historias es de alguna manera lo que lo motiva a seguir siempre adelante.
Agradezco a mi querido primo Jose el haber contado la historia que es un buen presente para su Cumpleaños.
Y esperemos seguir festejando!!!
Besos enormes !!
É…
Por essas e outras, alguns acontecimentos tornam a vida bela, impressionante e inesquecível.
Quem diria que um mecânico da província, lá de um rincão esquecido, lutando para viver como socorrista, iria se tornar um recordista mundial.
Tio Coco é mesmo um sortudo!
Belo relato de vida.
Quem diria, Juan Manuel Fangio foi socorrista mecânico.
Era a época romântica do automobilismo. Ainda não havia contratos milionários e o grande espaço que o esporte ocupa na mídia. Era necessário ter uma ocupação para ganhar o pão de cada dia, senão a família morreria de fome. A coisa era feita pura paixão.
Pelos vídeos conheci mais sobre a vida deste grande campeão.
E o tio da Marta (Tio Coco) teve uma história para contar para os amigos, filhos e netos.
Bacana seu relato.
O lindo passeio familiar terminou bem devido a solidariedade e a ajuda providencial de um campeão. Isso mostra que ninguém brilha ou acontece em um repente e que todos os grandes astros tem uma trajetória de muita luta, garra e foco no objetivo.